sábado, 11 de agosto de 2012

VALE A PENA ENSINAR LITERATURA???


                              


   Tempos difíceis... Como já estamos habituados há décadas, é grande o descaso da sociedade para com o ensino. As greves de profissionais do setor são ignoradas pelos governantes, na expectativa de que o tempo irá corroem o ímpeto dos mestres, colocando-os diante do desafio de não prejudicar seus alunos.  Isto tudo alimenta a hipocrisia generalizada, aquela visão segundo a qual somos todos a favor, mas o que vamos fazer? Um aspecto há nisso tudo para o qual pouco se presta atenção: o que está em jogo não é se os alunos perderão o ano ou não, mas sim, e principalmente, como ficará a qualidade do ensino que lhes é ministrada... O que lhes é ensinado? Para quê? Estamos formando gerações para o futuro exercício pleno da cidadania, para o gozo de direitos e o exercício de deveres sociais? Estamos formando pessoas capazes de assumir responsabilidades e pensar criticamente soluções para os problemas do país?
      Acho que é momento pra se colocar vários tópicos em discussão, desde a eficácia do recurso à greve, como também a necessidade de se criar outros espaços para se compartilhar conhecimento, se concretizar experiências de ensino também fora dos muros das escolas e universidades. Tenho pensado muito nisso, Criar projetos de levar o ensino de Literatura para fora do ambiente acadêmico, fora dos limites estreitos desta instituição tão debilitada como a escola. 
     Bem, antes de prosseguir, vale uma pergunta: vale a pena estudar/ensinar/compartilhar Literatura? Num mundo em que tantos desafios se oferecem ao homem, eu inverto a pergunta: vale a pena perder tempo debatendo se é importante ou não trabalhar com nossos alunos uma disciplina que tem tudo para estimular a imaginação e a criatividade? Claro que já me comprometo com um certo tipo de ensino de Literatura. Fica subentendido que não estou tratando aqui da mera decoreba de nomes e datas, e sim do convívio pleno e efetivo dos alunos com o texto literário, como objeto de leitura, análise, debate, e também como oportunidade para o aprimoramento da capacidade de expressão escrita. Sim, de quebra, estaremos formando os talentos do futuro.
     Dito isso, fica claro que estamos tratando do ensino, da produção de conhecimento numa área das mais essenciais para o ser humano. A arte literária diz respeito ao pleno exercício da faculdade da imaginação, instrumento de ação e participação que faz de cada um de nós plenamente humanos. Diante de um mundo mecanizado, como o nosso, mais do que nunca se coloca como essencial o debate e a produção de novos projetos para o ensino de Literatura.
      Não é de se surpreender o desprestígio da disciplina dentro da escola atualmente. No senso comum alimenta-se a visão de que estudar só se justifica dentro de uma perspectiva de profissionalização a mais imediata possível. A tecnocracia produtivista que caracteriza o capitalismo industrial e financeiro faz as pessoas pensarem apenas em valorizar o que seja "útil", numa acepção restrita de "rentável". Ora, nossa disciplina articula conhecimentos e experiências que acompanham a todos os seres humanos a qualquer momento, ao longo da vida. Não damos um conteúdo a ser memorizado e depois esquecido ou aplicado na vida profissional. Trabalhamos conteúdos que passam a circular na corrente sanguínea de cada pessoa, pois a Literatura é para todos.
      Por isso é que reitero que o caminho é pensar alternativas, de modo a chamar a atenção da sociedade para a importância do aprendizado, o aprimoramento do letramento literário. O desafio é grande, mas é nisso que tenho pensado atualmente. Foi o que me levou a imaginar a criação do projeto "Poesia Cantada e Ensino de Literatura".
     Com efeito, não é preciso muito esforço para verificarmos empiricamente, em nosso cotidiano, que a canção popular é a modalidade de texto poético com a qual nosso povo está mais habituado, que o acompanha como o seu quinhão diário de ficção e lirismo, para usarmos a expressão feliz do mestre Antonio Candido. Por este motivo, tenho me interessado na construção de propostas de ensino de Literatura que passem pelo intenso aproveitamento da canção. Além de ter seu ensino justificado por se tratar, ela própria, de uma modalidade de poesia, ainda tem tudo para se transformar em valiosos aliado na criação de estratégias de ensino dinâmicas e criativas, que criem condições para que os alunos de todos os níveis de ensino, e mesmo para interessados em nossas oficinas fora da escola, se familiarizem cada vez mais com as outras modalidades de texto literário.

     O trabalho já começou, tenho encontrado já alguns parceiros valiosos entre meus alunos, mas ainda temos muito trabalho pela frente.

Referência Bibliográfica:

CANDIDO, Antonio. O direito à literatura. In: Vparios Escritos. São Paulo: Duas Cidades, 1995.

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